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domingo, 15 de dezembro de 2013

O Corcel e o Lobo





Num imenso campo coberto por neve corria sossegado um galante e esbelto Cavalo. Ofegante, o animal encontrava dificuldades em se locomover em um ritmo que um dia havia deixado clara todas as suas habilidades e estrutura física. O excesso de neve em seus cascos deixava todo aquele movimento cansativo demais.
Eis que o som rítmico do trotar do Cavalo é interrompido pela aproximação de um Lobo. O canino aparentemente não fazia nenhuma mensura de estar preparando um ataque, no entanto o instinto desconfiado do Cavalo o fez acelerar o galope a fim de que com aquele esforço o Lobo ficasse para trás e desistisse da sua suposta tentativa de caça.

De imediato ficou mais proeminente a distancia entre os dois animais, porém o Lobo recusava-se a ceder como o Corcel desejava, ao contrário disso, sem se deixar abater o Lobo concentrou-se em encurtar a distancia entre eles de forma gradativa. Sucedido, depois de algum tempo consegue se aproximar de tal forma que era acertado constantemente pela neve que se elevava com o galopar do outro animal.
É o fim, pensou o Corcel. Havia viajado dias e noites incessantemente cruzando planilhas e elevações enquanto enfrentava toda sorte de intempéries para perecer por que o acaso o tinha levado a aquela região? Aos infernos com aquele lobo! Aos infernos com o seu descuido ao prolongar os intervalos entre os descansos. Não queria morrer ali, havia muita estrada a percorrer, muitas escolhas a fazer e dentre essas muitas escolhas as que ele fizesse naquele momento mudariam tudo. Ao menos não desistirei tão fácil, escolheu ele, se esse lobo quiser me rasgar a garganta terá que lutar!
Com espírito renovado, preparava-se para o enfrentamento quando de súbito percebeu que o Lobo agora corria a seu lado. Agradecido ao mesmo tempo em que confuso sobre as reais intenções do Lobo, ele começa a perceber os fatos que seu instinto defensivo tinha deixado de relevar: Já havia enfrentado enrascadas contra lobos antes e o ataque era sempre em grupo onde o ordenamento do grupo no momento do ataque era o que o tornava eficaz, por sorte os ataques anteriores haviam sido em campo aberto e seu vigor tinha prevalecido.
Ficava claro que embora tivesse o terreno a seu favor o Lobo sozinho sabia que sua vitória era incerta e uma derrota iria lhe custar severos coices. Mas então o que levaria um Lobo a correr junto dele? Toda tensão inicial agora tinha sido convertida em curiosidade. Estava determinado a descobrir com que perspectiva o Lobo se mantinha a o perseguir de perto. Resolveu então observar por um tempo. O que se mostrou ineficaz, o Lobo conservava um olhar fixo no caminho adiante salvo quando deixava a atenção vaguear como quem sondasse possíveis caminhos alternativos. A única hipótese que o Corcel julgava possível era que talvez o Lobo só estivesse cansado de andar sozinho por aí e um companheiro de viajem estimularia seus impulsos competitivos.
Numa tentativa de comprovar suas suspeitas, o Cavalo acelera mais uma vez o galope e fica satisfeito com os resultados ao ver que o Lobo faz o mesmo. A partir daí se estabelece uma alternância frenética de líderes onde nenhuma das partes queria deixar escapar a primeira posição numa corrida imaginária com regras e destino que só aqueles dois conheciam. Dois corredores dando uma amostra das suas determinações enquanto a lua brilhava no alto e a neve cobria o que um dia havia sido verde com a cor e fluidez comparável a um tapete de nuvens. Aquela configuração do ambiente era mágica. Era como se cada elemento conspirasse pra enaltecer o que já era belo. Até que, por acordo taciturno, ambos os animais puseram-se a caminhar lentamente esperando que o frio daquela noite abrandasse o calor de seus corações e evitasse que mantivessem o ritmo que poderia causar morte por exaustão.
 Ao amanhecer, não havia mais neve no caminho e sentir a grama verdejante reacendeu o desejo do Corcel de correr a toda velocidade. Desta vez, sem chance pra o Lobo que se manteve bem atrás marcando um ritmo próprio, respeitando os limites das próprias capacidades.  O Corcel que não tinha nada a ver com isso manteve-se em disparada externando todo seu vigor e dotes físicos.
No fim da tarde daquele mesmo dia o Corcel finalmente interrompe sua corrida ao dar de cara com uma montanha bloqueando seu caminho. Transtornado, tentou avistar um meio de contornar a montanha, mas esta era flanqueada por uma floresta no lado esquerdo e muito extensa no direito. Teria então que atravessá-la se quisesse prosseguir, o que não seria nada fácil.
Reuniu coragem e iniciou uma subida vagarosa até que o cansaço o fez cair antes mesmo de chegar à metade da inclinação. Rendeu-se as reclamações do corpo e foi encontrar sossego se alimentando da vegetação do pé da montanha. Após se sentir satisfeito ficou com os pensamentos voltados para o Lobo que havia deixado pra trás. Havia se divertido muito com a corrida na noite anterior mesmo com toda aquela neve. No entanto, o dia havia mudado, o terreno havia mudado e ele precisava seguir em frente.
Sem perceber, caiu no sono.  Era inicio da noite e tudo estava estranhamente calmo. Passou-se algumas horas enquanto ele dormia até que:
 - ÁUUUUUUUUUUU.
De súbito, o Corcel abre os olhos assustado e olha a sua volta. Ainda era noite e aquele som parecia ter vindo da floresta que ladeava a montanha. Poderia ter sido o mesmo Lobo da noite anterior? Parecia difícil, afinal, aquele devia estar bem atrás, provavelmente teria descansado durante o dia. Por via das dúvidas resolveu se colocar em movimento estava preocupado com a possibilidade de ser outro lobo em seu encalço e que este não estivesse só desta vez. Teria de escalar logo aquela montanha. Estava cansado, mas ele acreditava que a vontade supera as capacidades físicas.
A subida não foi nada fácil e cada passo era uma luta de resistência. Recusou-se a subir por regiões que considerava de risco por diversas vezes, procurando outro caminho e parando em muitas outras, mas por fim conseguiu. Ainda era noite quando ele descia pelo outro lado. Finalmente se sentia livre, se sentia realizado, mas não totalmente claro, sua jornada tinha de continuar, o horizonte era a única coisa que ele seguia naquela jornada sem fim, mesmo que alguém o recriminasse e dissesse que o horizonte era só um ponto de vista, sentia-se vivo desde que não parasse e era o que não iria fazer. Mesmo que vagarosamente lá estava ele caminhando exausto mais uma dentre as inúmeras vezes. Mas de um jeito diferente de todas as outras vezes ainda havia algo estranho, estava tudo muito quieto na floresta que flanqueava a montanha e se estendia agora ladeando seu caminho. Era como se... toda a floresta temesse algo... ele não tinha certeza. Continuou alternando suas ações entre caminhar e espreitar a floresta até que ouve um barulho: aparentemente o farfalhar de folhas, algo pareceu movimentar-se fazendo remexer a vegetação na floresta. Medo e expectativa crescem no coração do perseguidor do infinito quando de lá de dentro sai o mesmo lobo que antes havia ficado pra trás, desta vez, estava diferente havia ganhado uma cicatriz na pata dianteira direita e gotículas de sangue manchava seu espesso pelo. O Corcel não sabia se dava as boas vindas ou se preparava para se defender, afinal as intenções do Lobo poderia ter mudado, ele poderia muito bem não estar só desta vez.  Pra seu alivio enquanto o Lobo se aproximava nenhum sinal era notado na floresta, só então conformou-se com a ideia de estar seguro e o desejo de competição voltou a pulsar em seu intimo. O Lobo pareceu perceber e disposto a atiçar aquele sentimento, pois disparou como quem estivesse impondo um desafio. E como correram... A falta de neve diminuiu a dificuldade, mas não a beleza do espetáculo.
Competiam, mas era uma competição sadia. A alteridade expressa através da competição é uma forma de se medir o próprio desempenho até mesmo quando se compete consigo mesmo e aqueles que buscam melhorar estão sempre competindo. Eles eram animais diferentes, que pensavam de forma diferente, que falavam uma língua diferente e que haviam escolhido rotas diferentes, no entanto, não discutiam, não brigavam ou se destruíam mutuamente, afinal, por menor que fosse, eles tinham uma coisa em comum: seguiam na mesma direção.


Nota: Eu sei que é um pouco longo e talvez cansativo, mas espero que tenha aproveitado. É mais uma vez um conto com uma mensagem boa que queria compartilhar com você. De fato, a ausência de postagens tem prejudicado o crescimento do blog, mas o que posso afirmar pra você que tem apreço pelo que é publicado aqui é que as produções estão ocorrendo. A demora só é sinal do cuidado que os administradores têm com a qualidade do blog. Acredito que, como os personagens do conto, eles com suas diferenças seguem direcionados a fazer deste um ambiente de criação de conhecimento onde o texto não acaba no ponto final, mas que o texto seja um conjunto onde as duvidas, criticas e quaisquer ideias surgidas nos comentários complementem e façam parte do todo denominado texto. Obrigado por não nos abandonar e como eu disse deixe os seus sussurros do pensamento!