Não deixe de comentar, seu comentario é nosso incentivo!!!

domingo, 2 de junho de 2013

Inimigo: Eu [Parte 2]


Durante alguns instantes, Daniel fica completamente paralisado diante da tela do computador, até que retorna a si de súbito quando alguém bate à sua porta. Ele imediatamente desliga o monitor e se abaixa para fingir que deixou cair algo no chão. Isso também é uma forma de se recuperar do susto e respirar fundo um pouco.

- Daniel? - pergunta Bárbara, de pé na porta segurando a maçaneta.
- Oi, Bárbara. - responde ele ainda abaixado fingindo estar procurando algo debaixo da mesa.
- O que você está fazendo? - pergunta ela sorrindo.
- A minha caneta caiu aqui no chão.
- Daniel. Sua caneta está na mesa, bem na sua frente. - diz ela apontando.
- Ah! É verdade! Que cabeça a minha - diz ele com um sorriso nervoso e já retornando a posição normal.
- Hum. Vamos logo para a reunião matinal. O sargento mandou te chamar. Ele quer informações sobre o caso do estupro de ontem.
- Si.. sim. Já estarei lá. Vou só reunir o material pra levar. -  responde ele nervosamente.
Bárbara balança a cabeça, vira de costas e sai, fechando a porta.

Daniel liga novamente o monitor e fica olhando para a tela por alguns instantes. Resolve fechar o programa, limpando seu histórico recente, remove a página do perfil de DNA do scanner enfiando-o no bolso da calça, levanta e vai em direção à sala de reunião. Ao chegar perto da entrada ficou imaginando que certamente perguntariam sobre o caso de ontem. Sem saber ainda o que fazer, ele simplesmente resolve seguir direto e se dirige ao elevador. Entra e aperta o botão do térreo. Seu telefone toca.

- Oi, Rafael.
- Daniel, aconteceu de novo. Acabei de receber uma ligação e estou indo pra lá.
- O que aconteceu? - pergunta Daniel um pouco confuso.
- Outro homicídio parecido com o de ontem. Av. Thomas Edison, número 12.
- Certo, estou indo pra lá. - diz ele já dirigindo-se para o carro.

Cerca de meia hora depois Daniel chega ao local informado por Rafael. Na frente da casa uma pequena aglomeração de vizinhos e curiosos se formou, fazendo com que ele tenha que pedir licença para algumas pessoas até poder alcançar a fita de isolamento. Ele mostra a identificação para o policial que está de pé ao lado do cavalete e este suspende a fita para permitir sua passagem. Rafael está de pé, na porta da casa, aguardando sua chegada.

- Eu estava saindo da central quando recebi o telefonema. - diz Rafael logo que Daniel se aproxima.
- Não há sinais de arrombamento na porta - diz Daniel olhando para a fechadura da porta da frente.
- Exato. Também está tudo em ordem na sala, como você pode ver.
- O corpo da vítima está no quarto?
- Isso. E por lá também não há sinais de bagunça ou luta.

Daniel observa que a sala está em perfeito estado, indicando que ou nada aconteceu por ali, ou ela foi deliberadamente arrumada. A porta do quarto está semi-aberta e pela fresta é possível ver o corpo sobre a cama, também de bruços. Ele coloca as luvas de borracha, empurra a porta e entra. No quarto está tudo arrumado, exceto pela cama que está um pouco bagunçada.

- A moça aí se chamava Camila Perkins. Trabalhava como caixa no Mall Wart. Depois daqui, vou ao local onde ela trabalhava para conversar com os colegas dela. - diz Rafael segurando seu bloco de anotação.
- Ok - diz Daniel examinando o corpo - Camila tem marcas na região do pescoço, indicando um possível estrangulamento. Assim como a moça de ontem, ela também teve o polegar direito removido com um corte preciso na junta entre os ossos.
- O que mais? - pergunta Rafael.
- O fato dela estar sem a parte de baixo da roupa pode indicar que houve estupro, mas não dá pra afirmar nada de forma certa sem a análise do legista. Preciso procurar por mais evidências pelo quarto, você pode me deixar sozinho por um instante?

Rafael sai do quarto sem nada dizer. Daniel vai atrás e fecha a porta quando ele sai. Ele também fecha a cortina da janela e deixa o ambiente o mais escuro possível para poder usar sua lanterna UV afim de detectar restos de sêmen ou outro fluido que o agressor possa ter deixado para trás, mas não encontra. Ele consegue, porém, coletar fios de cabelo nas mãos da vítima e na cama. Ele também acaba encontrando algumas digitais na maçaneta da porta do quarto. Fora isso, nada mais pode ser encontrado lá.

- Encontrei uns fios de cabelo e algumas digitais. Vou levar isso para análise no laboratório. - diz Daniel saindo do quarto.
- E o dedo que cortaram?
- Nenhum sinal dele, nem do instrumento que foi usado para isso.
- Tudo bem. Vou mandar remover o corpo e lacrar o quarto.

Algumas horas depois, já de volta para a central, Rafael entra na sala de Daniel.

- Olha só, acabo de vir do laboratório. Das digitais que você coletou, uma pertence à própria vítima, a outra pertence a Matteus Hecktor.
- É, estou vendo aqui. - diz Daniel acessando as informações do caso no computador - Esse tal Hecktor já cumpriu pena por estupro.
- Sim. E quando comparamos o perfil de DNA dos fios de cabelo que você coletou com o desse cara, o resultado foi positivo. Acho que pegamos o desgraçado.
- Já mandaram uma viatura apreender ele?
- Já, sim. Devem estar trazendo ele a qualquer instante.

Uma movimentação na entrada principal lhes chamam a atenção. Dois policiais trazem um homem forte, alto e com a barba por fazer. No braço direito pode-se ver uma tatuagem de uma caveira sobre um símbolo geométrico.

- Esse é o cara. Esse é o Hecktor - diz Rafael apontando para a sala principal através do vidro. - Só acho estranho como um cara como esse pode ter sido tão cuidadoso ao ponto de não deixar nada bagunçado na casa da vítima. Isso me soa bastante estranho.
- Como assim? - pergunta Daniel sentindo uma ponta de preocupação. - O cara pode ter uma aparência bruta, mas pode ser metódico, oras.
- É. Pode ser, mas com certeza tem algo de estranho aí.

Hecktor é levado para a sala de interrogatório, onde Rafael entra cerca de 20 minutos depois e começa a lhe fazer perguntas.

- Hecktor. O que você estava fazendo ontem à noite? - pergunta Rafael olhando nos olhos de Hecktor.
- Eu estava em casa, bebendo e vendo televisão.
- Com mais quem?
- Eu estava sozinho. Eu moro sozinho, porra!
- Sim. Muito conveniente. Mas nós sabemos que você esteve ontem na casa de Camila Perkins.
- De quem? - pergunta Hecktor franzindo a testa.
- Camila Perkins, seu desgraçado! Ela está morta! Você matou ela!
- Eu não matei ninguém! Eu estava em casa ontem!!!
- Pra que ficar fingindo, Hecktor, encontramos suas digitais na porta e seus fios de cabelo nas mãos desta moça! - grita Rafael batendo na mesa, jogando uma foto de Camila para Hecktor ver.
- O que? Como assim? - diz ele com expressão de surpresa - Eu nunca vi essa vagabunda!
- Ah, então ela é vagabunda? Foi por isso que você matou ela?
- Não.. Eu não disse isso!
- Mas você chamou ela de vagabunda. Você tinha raiva dela. Foi por isso que a matou.
- Eu não vou falar mais nada. Eu quero meu advogado.
- Tá certo, você vai ter sua merda de seu advogado, mas você não vai escapar seu desgraçado. Eu vou provar que foi você que matou as duas moças.
- Duas moças? Vai se ferrar, filho da puta! Eu não fiz nada! - diz Hecktor estendendo os dedos médios em riste para o detetive.
- Eu vou te pegar, desgraçado! - diz Rafael levantando. Ele sai da sala batendo a porta de forma violenta.

- Você ficou nervoso, hein? - diz Daniel assim que seu colega sai da sala de interrogatório
- Porra! É muita cara de pau! As evidências mostram que ele esteve lá e ele nega como se nada estivesse acontecendo!
- Isso é típico de um comportamento sociopata, Rafael.
- Ah. Eu vou sair pra tomar um café. Preciso me acalmar um pouco. Você vem?
- Não, não. Preciso terminar umas coisas antes - diz Daniel. - depois a gente se fala.
- Tá certo.

Daniel observa enquanto Hecktor é retirado da sala de interrogatório e levado para uma das celas da carceragem. Ele precisava falar com aquele homem. Ele precisava saber o que aconteceu e porque o outro homicídio foi tão parecido com esse. Porque cortar os dedos das mulheres? A cela para a qual o levaram era a de número 9. Agora não era uma boa hora para fazer isso. Muitos poderiam vê-lo. Ao invés disso ele esperaria anoitecer e aí, sim, viria falar com ele extra oficialmente. Ele voltou para sua sala e esperou.

Por volta das 20:30, a maioria das pessoas já haviam deixado seu andar. Daniel foi para o elevador e apertou o segundo andar, onde ficavam as celas para os presos preventivos. Era o caso de Hecktor. Daniel viu quando o guarda que toma conta da entrada principal saiu para ir ao banheiro e aproveitou a oportunidade para entrar no corredor e dirigir-se até a cela número 9.

O policial Dimitri estava no banheiro quando ouviu gritos vindo do conjunto de celas. Eram gritos de horror de uma pessoa desesperada. Ele imediatamente interrompeu o que estava fazendo, fechou o zíper da calça, pegou sua pistola e correu até o corredor de celas. Chegando lá, não encontrou ninguém além do prisioneiro da cela 9 completamente encolhido, acuado no canto, com os olhos arregalados. Ele estava em choque. Dimitri olhou ao redor mas não encontrou sinais de que alguém estivera por lá.

Eram 3:15 da manhã quando o telefone de Daniel toca, fazendo-o levantar da cama num sobressalto.

- Alô!
- Daniel? Tá acordado? É Rafael.
- Agora não mais. O que aconteceu? São três horas da manhã, cara.
- Hecktor está morto, Daniel. Ele se enforcou na própria cela com um lençol. Acabei de saber.
- O que? - pergunta Daniel meio atordoado.
- O policial que está de plantão, Dimitri, me ligou. Ele foi fazer a ronda de rotina e achou o cara pendurado.
- Bem. Então com a morte do principal suspeito vão arquivar o caso, não é?
- Não sei. Mas amanhã de manhã quero sentar contigo e rever todas as evidências forenses que você levantou. Vamos repassar tudo. Tem alguma coisa estranha nisso tudo.
- Ok. Amanhã nos falamos. - diz Daniel desligando o telefone.

Sem sono e agora preocupado, Daniel resolve levantar e vai até a cozinha pegar sua garrafa de Red Label e um copo. Ele apóia o copo sobre a mesa de centro, senta-se no sofá e começa a encher o copo com Whisky. - Merda! - diz ele sozinho - Esqueci a porra do gelo de novo. Ah não. Agora eu vou pegar. - e levanta novamente para buscar o gelo. Ele abre a porta da geladeira e abre o congelador para pegar as cubas de gelo, mas quando a porta se abre o que ele vê o faz soltar o copo, que se parte em vários pedaços espalhando vidro e bebida por todo o chão da cozinha. Daniel fica ali, imóvel.

Dentro de seu congelador, estão dois polegares direitos, congelados.

[Continua...]